Eis ai um belo exemplo de democracia, uma eleição de esquerdistas... realmente, Lula é um GRANDE estadista DEMOCRÁTICO.
Serão mesmo? Pensaria o contrário quem, sem nada saber dos candidatos, visse as fotos diárias que a imprensa publica de cada um deles a assistir à missa; ou suas declarações de fé; ou suas confraternizações com pastores e políticos evangélicos; ou as promessas de obediência que fazem a líderes religiosos; ou suas renegações da proposta da descriminalização do aborto...
A Teologia da Libertação está ai para provar a total possibilidade de junção entre esquerdismo e religião. Se alguém têm dúvidas da possibilidade, e até mesmo da intencionalidade disso, leia os textos de Antônio Gramsci para perceber o que é a nova proposta da esquerda ocidental.
Dois dias atrás, afirmando que uma eleição é o pior momento para debater qualquer questão que seja, Contardo Calligaris postergou uma discussão sobre o aborto. Acho que ele estava certo. Contudo, tendo lido inúmeros ataques à tese de que o aborto deve ser descriminalizado, mas nenhum argumento a favor dela, resolvi lembrar aqui alguns que me parecem decisivos.
E, para mim, os argumentos mais decisivos são os do filósofo francês Francis Kaplan no seu livro "O Embrião É um Ser Vivo?", por ele resumidos em entrevista que a Folha publicou em abril de 2008.
Segundo Kaplan, deve-se distinguir entre "estar vivo" e "ser um ser vivo". Um ser vivo não é apenas um ser que tem funções (pois várias partes do ser vivo têm funções), mas um ser que tem todas as funções necessárias para estar vivo. Assim é um ser humano, por exemplo. Já o olho do ser humano, na medida em que lhe faculta enxergar, está vivo, mas não é um ser vivo. O olho está vivo somente na medida em que faz parte do ser vivo que é o ser humano.
Quais seriam essas funções? Raciocinar, interagir, sociabilizar-se, etc?
Assim também o embrião está vivo somente enquanto parte de outro ser vivo, que é a sua mãe. Por si mesmo, "as funções vitais de que ele precisa para estar vivo são as da mãe. É graças à função digestiva da mãe que ele recebe o alimento, que pode usar somente por lhe chegar previamente digerido pela mãe; é graças à função glicogênica do fígado da mãe que ele recebe a glicose; é graças à função respiratória da mãe que os glóbulos vermelhos de seu sangue recebem o oxigênio; é graças à função excretória da mãe que ele expulsa materiais prejudiciais, dejetos que, de outro modo, o envenenariam".
A pergunta que Marcelo Coelho faz é muito interessante para essa questão, diz ele que: Isso significaria que o embrião é uma parte da mãe, como o olho é uma parte do ser vivo ao qual pertence. Mas o embrião também não provém do pai? E como se pode ser ao mesmo tempo uma parte de um ser vivo –a mãe—e uma parte de outro ser vivo –o pai? Não se deveria concluir que ele é um novo ser independente tanto da mãe quanto do pai?
E mais: "Não é o embrião que se desenvolve: é a mãe que, por meio da produção da serotonina periférica no sangue, determina, durante mais da metade da gestação, o desenvolvimento neurobiológico e a viabilidade futura do organismo que carrega".
Determina como, através de sua própria vontade?
Kaplan explica, ademais, que, pelo menos até o terceiro mês da concepção, o feto não tem atividade cerebral. Acontece que, como ele observa, "um homem sem atividade cerebral é considerado clinicamente morto".
Considerar clinicamente morto é factualmente estar morto?
Ora, "o prazo de três meses é o prazo dentro do qual a maioria das mulheres que quer abortar aborta, mesmo que possam legalmente fazê-lo mais tarde".
Dito isso, vê-se que não é totalmente verdadeiro, como se supõe às vezes, que o embrião esteja para uma criança como uma semente para uma árvore ou um ovo para uma ave. Uma semente largada na terra pode tornar-se uma árvore; e um ovo pode, sendo incubado, tornar-se uma ave; um embrião, porém, não é capaz de se tornar uma criança fora do corpo da mãe.
Heim??? Terra = Corpo; Ovo = Corpo; Um ovo não é um embrião. Uma semente não pode efetivar sua potencialidade sem o solo que terá de ceder a ela alimento para seu desenvolvimento. Apesar da analogia ser possível, ela, aqui, parece provar justamente o contrário do que Kaplan quer.
Se, portanto, não se pode comparar a destruição de uma semente com a derrubada de uma árvore nem se pode comparar quebrar um ovo com matar uma ave, menos ainda se pode comparar o aborto, como querem alguns religiosos, com o assassinato de uma pessoa.
A complexidade de uma arvore, ou de uma ave, não se compara a complexidade de um Ser Humano. No entanto, se destruíssemos todas as semente de uma determinada espécie de arvore, impediríamos que ela existisse. Considerando que arvores não têm identidade própria, como o tem todo Ser Humano, salvo os que sofrem de determinadas patologias, destruir um embrião é destruir um “ser único” em potência. Como diz o poeta Mário Quintana, roubam-lhe o céu, a beleza, roubam-lhe tudo, o aborto é o maior de todos os roubos. (paráfrase pois não me recordo literalmente dos versos)
Que pensar então da tese de que a vida da mãe não vale mais que a do feto?
É óbvio que a vida da mãe vale mais que a do feto, pois ela têm toda uma complexidade social que o feto ainda não têm, mas terá pois essa é sua potencialidade. Pensando nesse raciocínio, seria válido afirmar que a vida de um jovem – que têm toda uma potencialidade de possibilidades e tempo para viver - vale mais do que a de um velho – que por ter vivido e desgastado seu corpo já não têm mais tanto valor. Se houvesse uma situação, na qual somente um dos dois pudessem viver, quem seria o cooptado? Creio que todos já ouviram a frase: “Mulheres e Crianças primeiro.”
Diga-se a verdade: quem se opõe à descriminalização do aborto defende não a vida, como alega, mas sim uma crença religiosa segundo a qual nem o prazer sexual pode ser um fim em si mesmo nem o ser humano é dono de si próprio ou do seu corpo.
Muito pelo contrário, existem órgãos como o clitóris e a glande que servem para o prazer, e segunda a crença religiosa, Deus criou o homem com esses órgãos. Além disso, antes daquilo que a religião prega como “pecado original”, já havia a fecundidade e procriação, assim como os ciclos de fertilidade. Logo, o sexo é anterior a qualquer situação de condenação. Se assim fosse, toda a mulher estéril seria naturalmente apedrejada, o que não ocorre na crença cristã. Quanto ao ser humano ser dono de si próprio ou do seu corpo, sim, ele é dono se si e do seu corpo, porém não é dono do corpo de outrem. Além disso, é interessante notar que, quando alguém tenta exercer sua autonomia corporal em um ato de suicídio, todos os que se importam tentam faze-lo(a) declinar do intento. Isso ocorre por que tudo o que fazemos com o nosso corpo, em comunidade, não atinge somente a mim, mas a todos a minha volta.
Ora, cada qual tem o direito à crença religiosa que bem entender, mas o Estado, que deve ser laico, não pode adotar nenhuma delas em particular.
O direito à vida não é Crença Religiosa, é previsto na Constituição Laica do Estado Brasileiro.
Nenhuma mulher recorre ao aborto por prazer, mas por sofrimento e para evitar ainda maior sofrimento para si, para sua família e para a criança que nasceria.
Mentira. O aborto ocorre devido a gravidez indesejada oriunda de relações sexuais fora de ambientes propícios para a constituição familiar. Não é para evitar sofrimento, mas para dar fim as responsabilidades que devem vir junto com o relacionamento sexual. No mais, sempre há a possibilidade de ceder a criança para adoção.
É uma grande crueldade que o Estado penalize ainda mais justamente as mulheres pobres que, sem recursos, são obrigadas a praticar o aborto nas piores condições imagináveis.
Ninguém é obrigado a praticar aborto, pratica quem quer. E são as mulheres pobres que mais recorrem a esses métodos – se é que essa estimativa de fato é verdadeira – por que não têm as condições necessárias – educação de qualidade, saúde de qualidade, etc. O Estado quer solucionar um problema gerado pela sua incompetência administrativa ao invés de fazer seu trabalho. Mais interessante ainda é o apelo da religião que promulga o sexo com compromisso marital, onde o ambiente é propicio para o nascimento e desenvolvimento da criança gerada, enquanto há uma crescente erotização da sociedade, crianças fazendo sexo em escolas etc. Bastaria observar as estimativas geradas a partir do movimento hippie e daquelas feitas 9 meses depois do carnaval para perceber que o clamor do cristianismo serve para a preservação da vida, família e sociedade.
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